De acordo com o Banco Mundial, entre 1960 e 2022, a participação do PIB – Produto Interno Bruto - do Brasil, saltou de 26.40% para 50.40% em relação aos demais países da América do Sul. A Argentina e a Venezuela foram os países que apresentaram as maiores involuções. Sob o ponto de vista da produção de produtos e serviços, foi notável o aumento da participação brasileira, denotando o crescimento de nossa economia e a concomitante perda de relevância de outros países do continente. Entretanto, quando o olhar se volta para a forma como essa riqueza gerada está sendo distribuída, a situação piora bastante. Em 2020, nosso PIB per capita era de U$ 6.800,00, enquanto o Uruguai, país basicamente de economia agropastoril, ostentava U$ 15.400,00 , acima do Chile (U$ 13.200,00) e Argentina (8.400.00). Essa fotografia de como o nosso PIB é distribuído internamente nos remete a um dos maiores desafios do Brasil, que é permitir que haja uma menor desigualdade de renda entre os brasileiros, com o consequente fortalecimento de toda a economia. Também revela que o PIB, isoladamente, não é um indicador adequado para medir o desenvolvimento econômico e social de um determinado País, e que a sua leitura deve, necessariamente, incluir outras variáveis para uma análise mais consistente.
Foi de Delfim Netto, Ministro da Fazenda entre 1967 e 1974, época conhecida como “milagre econômico” a frase de que “é preciso primeiro aumentar o bolo (da renda nacional) para depois reparti-lo. A declaração se sustentava na premissa de que era natural que países em desenvolvimento teriam que, inevitavelmente, passar pela concentração de renda para somente depois tratar de socializar o crescimento. Com o passar dos anos, não apenas não ocorreu a esperada distribuição mais equilibrada de renda, como o Brasil se converteu num dos campeões mundiais de desigualdade social. Quase meio século após haver criado a “teoria do bolo”, Delfim Netto, num gesto elogiável de desprendimento e humildade intelectual, refutou aquilo que falou, e foi enfático ao dizer “que fazer o bolo crescer para depois distribuí-lo é sinal de ignorância econômica”. Para esse novo olhar de Delfim, a virtude social neoliberal vendida como meritocracia é uma fraude, porque a condição necessária para a sua existência, a igualdade de oportunidades, não existe. Refletir sobre esse tema é importante para que se descortinem soluções para um impasse social que mantém milhões de brasileiros na miséria. Definitivamente, sem que esse enorme contingente de pessoas seja incorporado a uma vida decente e produtiva, não poderemos falar de um país desenvolvido, mesmo que o crescimento do PIB seja robusto.
Nesse sentido, tornam-se óbvias questões como prioridade à educação de qualidade, programas sociais de renda mínima, universalização da saúde e geração de um ambiente favorável aos negócios. Mas não é apenas isso. O Brasil precisa se conectar uma concepção de desenvolvimento que hoje extrapola em muito o meramente econômico, cuja mensuração isolada do PIB é um exemplo acabado dessa miopia. Não basta crescer, é preciso desenvolver-se em harmonia com um conjunto de outras variáveis igualmente críticas, que, de forma equilibrada, poderão colocar o País num outro patamar de desenvolvimento. Os cuidados com a responsabilidade ambiental, social e de governança, também conhecidos sob a sigla ESG, que já permeiam a realidade de milhares de empresas, devem inspirar os gestores públicos. Para tanto, é essencial observar com rigor os objetivos estabelecidos pelo Pacto Global na questão do meio-ambiente, nos investimentos para combater a discriminação e possibilitar um tratamento justo aos excluídos socialmente, garantindo que nenhum grupo social deixe de ter acesso aos serviços essenciais. Uma governança adequada, com sólidos princípios éticos sendo incorporados, com transparência e zelo pelo erário também conformam a arquitetura que deverá ser a base para uma sociedade melhor. Não dá, e nisso Delfim acertou muito ao se reposicionar, esperar mais para que o bolo cresça.
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