A inteligência artificial tem encantado e assustado as pessoas quase que na mesma proporção. Assim como nos maravilhamos com a capacidade dos algoritmos realizarem combinações extraordinárias, que vasculham em segundos o gigantesco acervo digital em busca de respostas aos nossos questionamentos, também o receio do desconhecido sinaliza que alguns cuidados devem ser tomados, conforme muitos especialistas da área têm recomendado. O fato é que, como em quase toda a inovação de caráter disruptivo, há pouco a fazer em relação ao avanço inabalável do processo em marcha, como bem sugere a velocidade com a qual o ChatGPT, um assistente virtual inteligente, desenvolvido pela empresa OpenAI, vem conquistando usuários em todo o mundo. Essa aceleração no movimento de adesão à novidade digital é diretamente proporcional às mudanças que devem ocorrer a partir de um mecanismo que não apenas busca respostas, a exemplo do Google, mas elabora pareceres, sugere decisões, roteiros, cria melodias musicais e histórias de ficção, além de muitas outras soluções, a partir da interação entre o usuário e a máquina.
A capacidade gigantesca da inteligência artificial potencializar o conhecimento humano, traz também em si a necessidade de adaptação à mudança poucas vezes vista. Embora a IA atinja múltiplas áreas da vida social, econômica e cultural, é mais especificamente no mundo do trabalho que se projetam seus maiores impactos. Algumas profissões, como matemáticos, analistas financeiros, jornalistas, designers de interface Web, escriturários, pesquisadores de mercado, autores e escritores, poderão ter suas atividades substituídas ou grandemente afetadas pela inteligência da máquina, enquanto muitas outras atividades serão menos afetadas ou até mesmo obterão grandes sinergias na interação entre o trabalho humano e os algoritmos. Dessa forma, ao mesmo tempo em que essa simulação da linguagem humana, operada agora de forma inteligente, ameaça algumas profissões, ela destaca acentuadamente o lado mais “soft” das competências dos indivíduos, realçando aquilo que nos distingue: a capacidade de sentir, de se emocionar e de criar.
Numa visão mais inclusiva e menos sombria do futuro governado pela IA, a Inteligência emocional, a comunicação pessoal, a criatividade e o empreendedorismo, a capacidade de negociar e mediar conflitos e o desenvolvimento de novos profissionais estratégicos são competências que, por sua natureza eminentemente humana, estabelecerão espaços que coabitarão, sem que nenhum se sobreponha ao outro. A inteligência artificial, nessa perspectiva, se integrará ao conjunto de conhecimentos já existentes, potencializando-os, mas não prescindindo do engenho humano no seu sentido mais original e único, qual seja, o de conferir às emoções um espaço do qual nenhuma máquina seja capaz de se apropriar, não sem antes fazer desabar todo o edifício que a racionalidade e as emoções foram capazes de até aqui engendrar.
Parafraseando Steven Pinker, a Revolução Científica e o Iluminismo inauguraram um processo do conhecimento para melhorar, de modo contínuo e até agora inexorável, a condição humana. Sem dúvida, existem altos e baixos nessa jornada, mas as melhorias cumulativas a que assistimos e desfrutamos podem sugerir que os avanços tecnológicos que impulsionam o progresso só tendem a ganhar velocidade. Nesse campo promissor, a genômica, a biologia sintética, a neurociência, a ciência dos materiais, a ciência dos dados e análise de políticas baseadas em evidências estão florescendo. A Inteligência Artificial, a despeito das naturais restrições que enfrenta, sinaliza também integrar, com poder inaudito, o elenco de soluções que a era do conhecimento fomenta. Embora o progresso seja uma ação de auto-ocultamento, somente valorizado em retrospectiva, os sinais emitidos pela dança dos algoritmos nos revelam que somos contemporâneos de um mundo de espantosas possibilidades, e de cujo protagonismo não estamos dispostos a abrir mão.
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